Vários aspectos das suas vidas se associavam à cor azul. Para começar, o fumo denso que, como serpentes, subia dos seus cigarros para o tecto da divisão da casa. Depois, vários indícios foram lentamente emergindo, como bolhas de ar num denso molho em preparação. Primo, a melodia que A. escutava na telefonia. Secundo, o mostrador do relógio de pulso que T. acabava de estrear. Tertio, a face estupefacta de D. Na manhã seguinte as autoridades punham em curso uma nova investigação.

Arte performativa: ponto da situação

Da mesma maneira que uma aragem é o melhor refresco para um par de axilas transpiradas num dia de verão, assim a desistência de escrever sobre arte performativa representa o melhor antídoto para a minha pesada consciência. Não procurarei retratar-me, mas posso confiar-vos que vários fatores pesaram nesta decisão. Em primeiro lugar, o facto do meu adversário nesta contenda e co-autor deste blogue ser um peso-pesado na matéria. Em segundo lugar, o dado, não menos despiciendo, de eu não perceber patavina do assunto. Finalmente, a indisposição que experimento neste momento para qualquer desgarrada, física, estética ou moral, ainda para mais com um grande amigo que está a uns milhares de léguas de distância.

Num plano mais elevado do que este inventário de razões está, naturalmente, algo mais essencial: a constatação de que não gosto/ percebo de arte performativa, aliada à democrática convicção de que, apesar da subjetividade que sempre deve auxiliar o juízo estético, os outros estão no seu direito de gostar do que bem entenderem e de fazer o que quiserem. Acresce que, à semelhança do pequeno desgosto que sempre sinto cada vez que alguém me fala dos poderes palitativos de um bom queijo, talvez me desagrade o facto de não ir à bola com a arte performativa e que, enfim, me entristeça nada haver que possa remediar o problema. Que me pareça por vezes ruidosa, confusa e desprovida de pathos, pois sim, mas não me compete a mim apontá-lo. Que acredite em valores estéticos que, creio, nela estão ausentes, como a harmonia, o equilíbrio e o elemento trágico, verdadeiro também e, penso, legítimo. Porém, não enveredarei pelo proselitismo: nenhuma obra de arte alguma vez precisou que lhe anunciassem as virtudes ou denunciassem as fraquezas.

Para terminar, caro A., que a minha opinião não desgaste a tua determinação em fazer deste espaço um palco para a tua  performance e a difusão do teu credo artístico. Afinal, foi com esse desígnio que o criámos; e que sorte a minha de poder seguir a tua irrequieta pena.

D.