«Hoje as portas mudaram de todo de sítio, recuando para locais mais remotos e elevados; ninguém aponta o caminho; há muitos que andam de espada, mas apenas para a brandirem no ar, e o olhar que tentar segui-la sentir-se-á confuso. Assim sendo, talvez o melhor seja fazer o que fez Bucéfalo, mergulhar nos livros de direito. Livre, sem as coxas do cavaleiro a apertar-lhe os flancos, à luz suave do candeeiro, longe do clamor das batalhas, lê e vira as páginas dos nossos alfarrábios.»
Excerto de "O Novo Advogado", de Kafka, traduzido para português por Manuel Resende.
p.s. - Este post é dedicado aos meus amigos que, como Bucéfalo, cursaram direito. Sem ironias, bem entendido.
D.
Vários aspectos das suas vidas se associavam à cor azul. Para começar, o fumo denso que, como serpentes, subia dos seus cigarros para o tecto da divisão da casa. Depois, vários indícios foram lentamente emergindo, como bolhas de ar num denso molho em preparação. Primo, a melodia que A. escutava na telefonia. Secundo, o mostrador do relógio de pulso que T. acabava de estrear. Tertio, a face estupefacta de D. Na manhã seguinte as autoridades punham em curso uma nova investigação.